Paulo Alfredo Emílio Lauret

8. Paulo Alfredo Emílio Lauret – nasceu na Espiçandeira, concelho de Alenquer em 11 de Fevereiro de 1852, filho de Paulo Emílio Lauret (16) e de Ana de Jesus Piedade (17).

O seu pai, Paulo Emílio Lauret, era capitão do Exército Francês, tendo vindo para Portugal cerca de 1830, para combater os absolutistas ao lado das forças liberais.

Após a derrota de D. Miguel, Paulo Emílio Lauret deixa a vida castrense e dedica-se à agricultura, em Alenquer.

Com a Revolta da Maria da Fonte e da Patuleia, Paulo Emílio Lauret volta a quartéis integrado nas forças setembristas, tendo sido um dos derrotados da batalha de Torres Vedras, em 1846.

Termina assim a sua vida militar voltando a dedicar-se à agricultura, no mesmo lugar da vila de Alenquer.

Em 1860 tem um fim trágico, pois é assassinado por motivos que nunca seriam determinados.

Ana de Jesus Piedade falece pouco tempo depois, em 1862, deixando órfãos Paulo Alfredo e as suas duas irmãs mais velhas.

É nestas circunstâncias que Paulo Alfredo Lauret, em 1863, com 11 anos, é internado na Real Casa Pia de Lisboa (RCPL) tendo-lhe sido atribuído o n.º 107. A sua permanência neste estabelecimento iria estender-se até 1869.

A sua entrada na RCPL é contemporânea de um processo de desenvolvimento interno e de melhoria significativa de instalações e da qualidade do ensino, naquela instituição.

Verificou-se desde logo que Paulo Lauret tinha aptidão e gosto pelo Desenho, e sobretudo pela Ginástica, Esgrima e Natação.

Era então mestre de Ginástica na RCPL, Jean Roger, um reconhecido professor francês. Este considerou-o seu primeiro discípulo, o mais ilustre e distinto, preparando-o para professor. Em 1867, a direcção da Casa Pia nomeia Paulo Lauret professor adjunto à classe de Ginástica.

Em 1869, com os seus estudos terminados, a RCPL apoia Paulo Lauret a encontrar lugar como professor de ginástica, conseguindo que ele assumisse esse cargo no Seminário Maior de Coimbra.  A RCPL não se limitou a encontrar-lhe uma colocação como professor, mas contribuiu também, materialmente, para que ele iniciasse a sua vida profissional.

É de realçar o importante papel que a RCPL representou na vida de Paulo Lauret: recebeu-o em condições de grande debilidade física e psicológica, deu-lhe educação e formação, conseguindo que ele aos 17 anos estivesse preparado para desempenhar as funções de mestre de ginástica.

Colocado em Coimbra como professor do seminário local, introduziu aí o método de ensino da Ginástica que aprendera com Jean Roger. Em 1870 e 1871, Paulo Lauret acumula a sua actividade no seminário com a de professor na Santa Casa da Misericórdia de Coimbra.

Em 1872 regressa a Lisboa, tendo lecionado nos colégios de António Joaquim Abranches, Barros Proença e Roeder, e, posteriormente, nos de G. Wiperman e Balbina Raphael, e ainda no colégio feminino de Santa Marta. Ministrou ainda aulas particulares a aristocratas e a figuras destacadas da sociedade lisboeta.

É neste período que Paulo Lauret viaja pela Europa tendo estado em contacto com os mais modernos institutos e escolas de educação física.

Em 1876, é nomeado professor de Ginástica da Escola Moderna.

Em 1878, institui um “curso nocturno”. Nesse ano, lecciona simultaneamente nos colégios Alemão, Lusitano e Nacional.

É representante em Portugal da Casa Carue, de Paris, da qual manda vir todos os instrumentos indispensáveis à instalação de ginásios (cordas, halteres, massas, aparelhos de madeira, etc.).

Os aparelhos de ginástica que Paulo Lauret utilizava na sua metodologia eram usados nas melhores escolas europeias. Paulo Lauret ainda preconizava a utilização de aparelhos ortopédicos, porque os considerava como um dos mais importantes passos conquistados pela ginástica. Destes aparelhos, Paulo Lauret dava especial atenção aos do espanhol Joaquín Llad, de Jules-Léandre Pichery e da metodologia sueca. Paulo Lauret, que considerava Ling como o «verdadeiro propagador da gymnastica medical», era um bom conhecedor do que se passava no Instituto Central e Real de Ginástica de Estocolmo.” [1]

Em 15 de Novembro de 1878, Paulo Lauret editou o primeiro número do “O Gymnasta”, primeiro periódico português dedicado à ginástica e educação física, com o subtítulo de «órgão bi­mensal de educação física», sem ilustrações e ao preço de 20 réis. Paulo Lauret era director e proprietário, e contava com mais quatro colaboradores.

 

Afirmava-se no primeiro número do jornal: O Gymnasta “vem preencher uma lacuna sensível» e «pretende ser o órgão dum partido honroso: a educação física no nosso país». Afirmava-se ainda que o jornal «é um brado contra a incúria dos governos que têm deixado definhar e morrer, à míngua de uma sã educação moral e física, milhares e milhares de cidadãos».

No segundo número de O Gymnasta, em 1   de Dezembro de 1878, era atacada a inépcia dos governos monárquicos, por terem definido a ginástica como disciplina obrigatória no ensino primário sem que, para isso, tivessem criado as condições necessárias à sua execução.

“Com o objectivo de dar a conhecer o que se fazia a nível desportivo no resto da Europa, era comum aparecer na primeira página a secção «Notícias do Estrangeiro», como sucedeu no número 5, de 15 de Janeiro de 1879, com toda a capa a ser preenchida com uma notícia sobre a ginástica na Alemanha, retirada do jornal alemão Deufsche-Tum-Zeifung. Nessa edição, o periódico de Paulo Lauret contava com correspondentes no Porto, Tomar, Évora e Alenquer, mas nenhum no estrangeiro.”[2] 

Em 1880 casa com Maria Ana Stattmiller Saldanha e Albuquerque, representante da casa e título de conde da Ega. Era uma família antiga, sempre próxima da Corte, que após a Revolução Liberal foi perdendo a influência de que até então gozava.

Em Dezembro de 1880, Paulo Lauret aceitou um convite para leccionar no Colégio Francês do Porto, instituição que dispunha de boas instalações para a prática da ginástica.

Pouco depois da sua chegada ao Porto, Paulo Lauret recebeu um novo convite do médico Couto dos Santos, para montar o ginásio do «Instituto Sanitario Hydroterapico». Paulo Lauret levou a sua missão até ao fim, tornando o ginásio num espaço com excelentes condições.

A 9 de Outubro de 1881, Paulo Lauret foi nomeado professor auxiliar da Escolas Normais do Porto, leccionando a ginástica na escola do sexo masculino. No ano lectivo seguinte, também passou a ensinar na escola do sexo feminino.

Em 11 de Fevereiro de 1882, Paulo Lauret fundou no Porto, no Largo da Picaria, o Gymnasio Lauret e Sala D’Armas. Com o sucesso que teve nos primeiros anos, Paulo Lauret transferiu-se, em 24 de Julho de 1884, para o Largo do Laranjal 4, e depois para a Rua do Laranjal 193.

A imprensa caracteriza-o como possuindo todas as diversões próprias de um club, embora se tratasse de uma escola de ginástica e sala d’armas onde “se ensina methodicamente estas duas artes, com notavel aproveitamento dos discipulos, tanto creanças como adultos” e considerando que “nesta nova casa acha-se o Gymnasio Lauret perfeitamente instalado, tendo salas de gymnastica, de armas, bilhares, dança, tiro defferentes jogos, electricidade, banhos etc., o que tudo faz um conjuncto de estabelecimento de primeira ordem” (Ginásio Lauret no Porto, 1887, p. 19). Bem equipado, constituía um espaço agradável, arejado e bem iluminado, habilitado para o desenvolvimento de todo o tipo de aulas de ginástica (médica ou profilática, ortopédica, higiénica e artístico recreativa), contando com a colaboração de um médico e de vários professores de competência reconhecida (Ferreira, 1998, pp. 304-305). O ginásio, em 1887, oferecia diferentes cursos adequados à idade e ao sexo, como se sublinhava n’ O Ocidente: O ensino no Gymnasio Lauret está devidido em differentes cursos, conforme as idades dos discipulos, e regulado de modo a dar rezultados mais praticos e proveitosos. A sua frequencia é de 100 alumnos devididos do seguinte modo: meninas 7, meninos 33, adultos 60, tem um medico effectivo, o sr. Dr. Aureliano Cirne, e 250 socios protectores (Ginásio Lauret no Porto, 1887). [3]

Paulo Lauret desempenha ainda funções de professor no Hospital dos Alienados, Seminário Episcopal, colégios de Nossa Senhora da Glória, S. Carlos, S. Lázaro e Nacional, e nas escolas Moderna e Académica. Em Braga ensina nos colégios de S. Caetano e Académico.

Ainda em 1882, as Escolas Normais do Porto iniciaram o processo de construção dos ginásios para as duas escolas, tendo cabido a Paulo Lauret a função de supervisionar a sua construção.

Nunca esquecendo a sua infância e a sua estadia na Casa Pia, o seu ginásio do Porto ministrava aulas a oitenta alunos órfãos. É sócio de mérito de diversas instituições de assistência à infância e de academias de ginástica portuguesas e espanholas.

No Porto não se limitou a lecionar nos referidos estabelecimentos de ensino e a dar aulas particulares de ginástica e esgrima (Ferreira, 1998). Participou em concursos, festas gímnicas e saraus para que era convidado com seus alunos, bem como nas iniciativas que promovia para divulgação da modalidade, especialmente as sessões de propaganda que ocorreram no Gymnasio Lauret e Sala D’Armas, criado em 1882, e que por vezes contaram com a participação das crianças da Escola Froebel, orientadas por Paulo Lauret. Atividades que constituíram um esforço para fazer sentir aos educadores a necessidade e o benefício da educação física, bem como, separando ginástica elementar, apropriada ao desenvolvimento das crianças, da ginástica acrobática, demonstrar-lhes que os seus receios de verem os filhos “feitos num feixe ou transformados em saltimbancos” eram infundados (Lauret, 1887, pp. 69-71). O desempenho nos espetáculos, pelo dinamismo e desenvoltura de Lauret e seus alunos, parece ter atraído cada vez mais pessoas à causa da educação física.[4]

Paulo Lauret foi ainda Director honorário do Gymnasio Medico-Dinâmico de Madrid, do Gymnasio da Escola de Medicina de Sevilha e do Gymnasio Higiénico, Médico e Recreativo D.E. Castañon”.

“Em 26 de Março de 1882, volta a publicar de novo “O Gymnasta”, com sede na Rua da Alegria no Porto. Era o primeiro jornal do género que surgia na Cidade Invicta e apresentava a mesma imagem gráfica do antecessor lisboeta, republicando também vários artigos. Devido a dificuldades de cobrança de assinaturas, em 15 de Junho de 1882, termina a publicação com a emissão do n.º 6. Na década de 1880, Paulo Lauret faria mais uma incursão ao mundo dos periódicos desportivos, lançando de novo “O Gymnasta”.[5]

Colabora na imprensa diária com artigos sobre Ginástica, Esgrima, “Boxe francês”, Natação e jogo de bilhar, e colabora também com do periódico do Porto “O Velocipidista” (1893).

Em 1892, participa no Congresso Pedagógico Hispano-Português-Americano, realizado em Madrid, com uma tese sobre “Educação Física em Portugal”.

Em 1896 muda-se para o Brasil, Rio de Janeiro, com a sua filha Mariana. Supõe-se que as relações com sua mulher Maria Ana, se tivessem degradado, muito em função das suas convicções liberais, em antagonismo com uma postura mais conservadora da sua mulher.

No Rio de Janeiro fundou de novo o “Ginásio Lauret e Sala de Armas”, acumulando com as funções de professor em vários importantes colégios da capital brasileira.

A sua docência no Rio de Janeiro foi iniciada em 1896, no Colégio Abílio. Ao longo das décadas de 1900 e 1910, Lauret atuou em várias escolas do Rio de Janeiro e de Niterói, tais como o Colégio Diocesano de São José, o Colégio Pio Americano, o Colégio São Carlos e o Instituto de Ensino Rio Comprido.

Além desta actividade lectiva Paulo Lauret colaborará ainda com diversas instituições, nomeadamente com o Exército Brasileiro, Hospital Nacional Brasileiro e Guarda Nacional da Capital.

A sua presença na imprensa escrita brasileira também terá grande significado, quer com artigos teóricos, quer com notícias referentes à sua actividade profissional.

Faleceu no Brasil a 12 de Fevereiro de 1918

À dimensão de Paulo Lauret como teórico, divulgador e professor de Educação Física, deve-se adicionar a importância da sua obra escrita, tendo publicado cerca de dez livros, encontrando-se informação mais detalhada no dossier anexo.

Recebeu ainda Paulo Lauret os seguintes prémios: “Medalha de prata” Club Gymnastico Portuguez Lisboa, 1892; “Medalha de ouro” no concurso de educação physica – Badajoz, 1892; diplomas: Gymnasio Heyser – Paris, 1884;  Gymnasio Hygienico – Madrid, 1882; Gymnasio Social – Badajoz, 1892; Club Gymnastico Portuguez – Lisboa, 1892; e Club Gymnastico Portuguez – Rio, 1897.”

Bibliografia

Francisco Pinheiro, História da Imprensa Desportiva em Portugal, Edições Afrontamento, Lisboa 2011.

 Luís Mota, Paulo Lauret e o ensino da Educação Física em Portugal no último quartel do século XIX

Meily Assbú Linhales Ana Paula Gontijo da Fonseca, Paulo Lauret, um mestre português de ginástica na imprensa periódica do Rio de Janeiro (1880-1918).

Oliveira, Jorge (2012). O Ensino da Educação Física em Portugal. Difusão e Implementação da Ginástica Sueca em Portugal na Primeira Metade do Século XX. Tese de Doutoramento em Ciências da Educação. Universidade de Coimbra, pp. 76-91.

Notas

[1] Oliveira, Jorge (2012). O Ensino da Educação Física em Portugal. Difusão e Implementação da Ginástica Sueca em Portugal na Primeira Metade do Século XX. Tese de Doutoramento em Ciências da Educação. Universidade de Coimbra, pp. 76-91.
[2] Francisco Pinheiro, História da Imprensa Desportiva em Portugal, Edições Afrontamento, Lisboa 2011, p. 24
[3] Luís Mota, Paulo Lauret e o ensino da Educação Física em Portugal no último quartel do século XIX
[4] Luís Mota, Paulo Lauret e o ensino da Educação Física em Portugal no último quartel do século
[5] Francisco Pinheiro, História da Imprensa Desportiva em Portugal, Edições Afrontamento, Lisboa 2011.